O Uso do Canabidiol (CBD) em Epilepsias Refratárias: uma das inúmeras indicações com grande impacto na saúde e na qualidade de vida de muitas famílias ao redor do mundo.
- Dr. Luís Cláudio Azevedo

- 6 de ago.
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Atualizado: 7 de ago.

O canabidiol (CBD), um composto não psicoativo da planta Cannabis sativa, é uma importante ferramenta terapêutica para doenças neurológicas, com especial destaque para síndromes epilépticas de difícil controle, como a Síndrome de Dravet, a Síndrome de Lennox-Gastaut (SLG) e a Esclerose Tuberosa. Essas condições causam crises convulsivas severas que não respondem aos tratamentos convencionais, impactando profundamente a qualidade de vida dos pacientes e suas famílias. O CBD surge como uma alternativa eficaz, oferecendo avanços significativos no manejo dessas doenças raras.
Síndrome de Dravet
A Síndrome de Dravet é uma epilepsia genética rara que se manifesta no primeiro ano de vida, geralmente causada por uma mutação no gene SCN1A, que desregula a atividade elétrica cerebral. Caracteriza-se por convulsões frequentes e prolongadas, muitas vezes associadas à febre, e por atrasos no desenvolvimento motor e cognitivo.
Por ser uma epilepsia refratária, os medicamentos tradicionais costumam falhar. Nesse cenário, o CBD demonstrou reduzir significativamente a frequência e a gravidade das crises. A eficácia é tão notável que medicamentos à base de CBD, como o Epidiolex®, foram aprovados por agências reguladoras especificamente para tratar esta síndrome, representando um marco no controle das convulsões. Ainda assim, o tratamento exige uma abordagem multidisciplinar contínua para garantir o bem-estar do paciente.

Síndrome de Lennox-Gastaut (SLG)
A Síndrome de Lennox-Gastaut é outra forma grave de epilepsia infantil, com pico de início entre 3 e 5 anos. Ela é definida por três características principais: múltiplos tipos de crises convulsivas (especialmente tônicas, que ocorrem durante o sono), regressão no desenvolvimento cognitivo e um padrão elétrico anormal no eletroencefalograma (EEG).
A SLG possui alta resistência aos medicamentos convencionais. O tratamento busca um equilíbrio entre controlar as crises e minimizar os efeitos adversos dos fármacos. O canabidiol se destaca como uma opção promissora, atuando na modulação do sistema endocanabinoide para reduzir a excitabilidade dos neurônios. Estudos clínicos robustos comprovam que o CBD diminui a frequência e a intensidade das convulsões em pacientes com SLG, oferecendo uma nova perspectiva de tratamento.

Esclerose Tuberosa (CET)
A Esclerose Tuberosa é uma doença genética que provoca a formação de tumores benignos (chamados hamartomas) em diversos órgãos, com destaque para o cérebro e a pele. A epilepsia é uma das manifestações mais comuns e desafiadoras da CET, sendo frequentemente resistente às terapias padrão.
O tratamento da CET é complexo e multidisciplinar. Para os casos de epilepsia refratária associados à síndrome, o canabidiol se mostrou uma opção terapêutica eficaz. Pesquisas indicam que o CBD pode reduzir drasticamente a frequência das crises convulsivas em pacientes com CET, melhorando significativamente sua qualidade de vida.

Como o CBD Atua nessas Síndromes?
A epilepsia é causada por uma atividade elétrica excessiva e descontrolada no cérebro (hiperexcitabilidade neuronal). O sistema endocanabinoide (SEC) do nosso corpo tenta naturalmente regular esse desequilíbrio.
Diferente do THC, o CBD não atua diretamente nos principais receptores canabinoides (CB1). Seu mecanismo é mais diversificado:
Modula outros receptores: Ele influencia alvos como os receptores TRPV1 e GPR55, ajudando a diminuir a liberação de glutamato, um neurotransmissor que excita os neurônios.
Ação anti-inflamatória e neuroprotetora: O CBD reduz a inflamação no cérebro e protege os neurônios do estresse oxidativo, fatores que contribuem para a perpetuação das crises epilépticas.
Essa ação multifacetada torna o CBD eficaz no controle das convulsões sem os efeitos psicotrópicos do THC. Ainda assim, o próprio THC, por sua ação direta nos receptores CB1, também promove redução dos estímulos excitatórios, tendo-se mostrado efetivo em muitos casos, quando associado ao CBD, na redução de crises epilépticas.

Evidências Científicas e Diretrizes de Uso
A eficácia do CBD é apoiada por uma longa história de uso medicinal e, mais recentemente, por estudos clínicos rigorosos. O caso de Charlotte Figi, uma paciente com Síndrome de Dravet que teve uma redução drástica de suas crises com um extrato rico em CBD, foi marcante e impulsionou a pesquisa científica e a aceitação do composto como medicação pelas entidades regulamentadoras mundo afora.
Para Síndromes de Dravet e Lennox-Gastaut: Ensaios clínicos com o medicamento Epidiolex® mostraram uma redução na frequência de crises superior a 40% em muitos pacientes.
Para Esclerose Tuberosa: Um estudo relevante demonstrou que doses de 25 mg/kg/dia a 50 mg/kg/dia de CBD reduziram a frequência de convulsões em cerca de 48%, em comparação com 26,5% no grupo placebo.


Num cenário como este, onde o potencial da Cannabis Medicinal já se mostra efetivo e disponível para inúmeras patologias, é de fundamental que os médicos se mantenham atualizados sobre os avanços no uso terapêutico da cannabis medicinal, a fim de oferecer a melhor assistência possível aos seus pacientes.
Surpreendentemente, a despeito dos resultados e evidências cada vez maiores, enfrentamos ainda grande resistência por parte de profissionais de saúde e órgãos representativos, fruto da mais pura "desinformação voluntária", do estigma e do preconceito associados à planta Cannabis.
Conforta, entretanto, assistir e acompanhar, dia a dia, a evolução de cada paciente e a gratidão de seus familiares, combustível maior para seguirmos adiante, com os passos firmes e convictos, nessa gratificante jornada.
Definitivamente, ciência e preconceito não se podem misturar. Despeço-me hoje, deixando uma sonora vaia ao preconceito e um grande "Viva!" à ciência e à Cannabis Medicinal.
Dr. Luís Cláudio de Azevedo Silva é Médico especialista em Medicina Preventiva, com Pós-graduação em Psiquiatria e Cerificação em Medicina Endocanabinóide




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